Acredito que todos sabem, porque já estudaram na escola ou pelo menos ouviram falar, o que são pinturas rupestres. São aqueles desenhos encontrados em cavernas, feitas por homens da pré-história, que viveram há 30 ou 40 mil anos.
Esses desenhos, descobertos há apenas cerca de 150 anos, pela primeira vez na Espanha, na caverna de Altamira, eram feitos com pigmentos coloridos obtidos do carvão ou de argilas, minerais triturados, sangue, excrementos, ceras e resinas, claras e gemas de ovos e até saliva humana.
Os principais temas, além do ser humano, eram as figuras de animais e vegetais, e às vezes até representando ações como danças, lutas, rituais, caçadas e colheitas.
Suas traduções e interpretações são motivos de grandes discussões entre os especialistas. Uns acham que elas teriam objetivos educacionais, por assim dizer, para transmitir conhecimentos aos outros membros do grupo e através de gerações. Outros acham que elas teriam cunho ritualístico, e outros ainda acham que seriam simplesmente manifestações de arte.
Independente de quem esteja certo, e talvez todos estejam, uma coisa é certa: as pinturas rupestres são expressões! Ou seja, são formas de um ser, dotado de inteligência suficiente para produzi-las, se expressar para outros, ou para o mundo.
Vamos destrinchar essa frase…
Expressões são formas de alguém manifestar seus pensamentos exteriormente, podendo ser raciocínios lógicos, matemáticos, emoções e sentimentos, dores e alegrias… o que quer que seja.
Para criar essas expressões, o ser tem que ser dotado de uma certa inteligência, que lhe permite perceber que, através daquele meio, outros seres entenderão o que ele quis transmitir. Mais ainda, ele tem que raciocinar e chegar a uma conclusão de que sua produção tem de ser de uma forma específica tal que os outros a entenderão, e não de outra, porque com a outra não iriam entender.
Ele ou ela se expressa, obviamente, para o exterior, para outros seres. Não fosse assim, seria apenas uma forma egocêntrica de linguagem própria. Tudo bem, algumas vezes talvez as pinturas rupestres tenham sido isso mesmo, mas provavelmente seria uma ínfima parcela delas.
Sendo assim, essas manifestações teriam o intuito de comunicação. Em outras palavras, de construir uma interação com outros membros do grupo. Seja por motivos altruístas, afetuosos ou simplesmente para distração e divertimento.
E a última coisa é tudo isso ter o objetivo de deixar algo para o mundo, algo que todos que tiverem contato com a mensagem possam aproveitar de alguma forma.
Tá! Mas e o que isso tem a ver com o “modernas” do título?
Não há dúvida de que o principal meio de comunicação hoje em dia são os aplicativos de mensagens e as redes sociais. Até para arrumar trabalhos formais em grandes corporações elas podem ajudar… ou atrapalhar. E não há dúvida de que esse meio de comunicação está produzindo uma nova linguagem, uma nova forma de se comunicar, uma nova forma de transmitir uma mensagem e se fazer entender… ou não!
Abreviações, como SQN, PFV, SDDS, VDD, CTZ, OMG, LOL, PLMDDS, VLW, FDS, FLW, TBM, BRINKS, AMG, KD, OBG, MSM, U, RT, D+, At+, 9dades…
Criações de significados usando letras e pontuações, como XOXO, QQ, KKKK, rsrsrs, S2, :), :(, ;), :D…
Smiles, emojis e emoticons… Desenhinhos de tudo que se possa imaginar.
Não seriam essas nossas novas pinturas rupestres?! Vejamos as semelhanças.
Primeiro de tudo, não são palavras. Isto é, não são a representação formal da linguagem praticada pelos povos, seja na língua que for, inglês, português ou outra qualquer. Nem as abreviações são, pois essas existem formalmente também e têm sua escrita definida no léxico. Pegar só as primeiras letras das palavras, ou só as consoantes de uma palavra não é a forma culta de se abreviar nada.
Segundo, não há dúvida de que são expressões que manifestam pensamentos, sentimentos e raciocínios de quem as gera.
Depois, quem as produziu pela primeira vez tinha a intenção de ser compreendido pelos outros seres que teriam contato com aquilo. Para isso, usou a inteligência para pensar se assim seria entendido.
E, obviamente, essa é uma forma de comunicação para o exterior, para os outros membros do grupo, ou para o mundo (hoje em dia até é literalmente para o mundo!), a fim de interagir com eles, seja por motivos altruístas, afetuosos ou simplesmente para distração e divertimento.
A única coisa que talvez tenha mudado bastante seja o peso entre o altruísmo, entre educar ou deixar algo para que outros aproveitem, e o egocentrismo das manifestações públicas das redes sociais.
Hoje em dia me parece muito maior a parcela de pessoas que fazem isso para aparecer (não no sentido jocoso da palavra). Fazem isso para que os outros retribuam com alguma forma de reconhecimento, seja uma resposta, um “like” ou qualquer outra coisa, até mesmo uma objeção raivosa(!), e assim o produtor da mensagem tem seu ego massageado por saber que x milhares ou milhões de pessoas tiveram contato com a sua “obra”.
Enfim, nossas “artes rupestres” modernas estão aí, transformando nossa linguagem (que, como eu aprendi há muito tempo, e concordo, é uma coisa viva, e que muda), para o bem ou para o mal.
Por que para o bem ou para o mal? Porque essa forma resumida e simbólica de comunicação tem a tendência de gerar mais confusão na comunicação interpessoal do que a forma culta, ou seja, com as palavras corretas das línguas das nações. Se os assuntos tratados são os planos para o FDS, ou as KKKK da viagem de férias, ou as BRINKS com os AMG, tudo bem.
Mas e quando essa linguagem atingir documentos e relatórios que podem trazer transformações positivas ou evitar tragédias? Ou fizer parte da educação de médicos ou engenheiros, em livros sérios de conhecimentos fundamentais para até salvar vidas ou preservá-las? Ou estiver presente em estudos de novas tecnologias que possibilitarão avanços importantes na nossa sobrevivência como espécie, talvez indo povoar outros planetas ou resolver o problema do lixo e da poluição na Terra? Coisas em que uma confusão de comunicação pode causar um sério prejuízo!
Não sou contra a linguagem nova de abreviaturas e emojis, mas espero que ela nunca chegue a fazer parte das nossas “cavernas” mais importantes. E que a educação formal possa manter a norma culta da língua como a forma mais universal de comunicação escrita e falada, que todos, de qualquer idade ou região, entendam.
As eras dirão…